· O PIB cresceu 1,4% no 2º trimestre do ano, acima da estimativa da Fiesp (+1,0%) e da mediana das expectativas de mercado (+0,9%). Dados com ajuste sazonal. Destaque para a indústria de transformação, que cresceu 1,8% no 2° trimestre, intensificando o crescimento observado no trimestre anterior (+0,9%), o que reforça o cenário esperado de recuperação do setor no ano.
· Do lado da oferta, os destaques positivos foram o setor de serviços, que cresceu 1,0% no trimestre, e a indústria geral, que avançou 1,8%. Por outro lado, o setor agropecuário recuou 2,3% no período.
· Do lado da demanda, os destaques foram os desempenhos positivos do consumo das famílias (+1,3%) e da formação bruta de capital fixo (+2,1%). O consumo das famílias foi sustentado por um mercado de trabalho aquecido e pelo aumento da renda. A formação bruta de capital fixo também se expandiu num contexto de retomada da categoria de bens de capital.
Visão Fiesp: O resultado veio acima da expectativa, com consumo resiliente e continuidade da recuperação do investimento, da construção civil e da indústria de transformação. A expansão da renda das famílias (liderada por um mercado de trabalho aquecido, pelo pagamento de precatórios, pelo aumento real do salário-mínimo e pela antecipação do pagamento do 13º salário aos beneficiários do INSS) contribuiu para o crescimento do PIB no 2º trimestre do ano. A Fiesp revisou a projeção de crescimento do PIB para 2,7% em 2024, em virtude das surpresas positivas da atividade no 1º semestre e da recuperação da atividade econômica no Rio Grande do Sul.
Resultados trimestrais
O PIB brasileiro cresceu 1,4% no 2º trimestre em relação ao 1º trimestre, considerando dados com ajuste sazonal. Este desempenho veio acima da projeção da Fiesp (+1,0%) e da expectativa do mercado (+0,9%). Em relação ao 2º trimestre de 2023, foi registrado crescimento de 3,3%. Com este resultado no 2º trimestre do ano, o carregamento estatístico[1] para 2024 é de 2,5%.
Pela ótica da oferta, a principal variação positiva foi da indústria geral, que apresentou crescimento de 1,8%, com avanços da indústria de transformação (+1,8%), da construção civil (+3,5%) e do setor de eletricidade, gás, água e esgoto (+4,2%). O único segmento industrial que registrou queda foi a indústria extrativa (-4,4%). O setor de serviços, por sua vez, cresceu 1,0%, com destaque para atividades financeiras, de seguros e serviços relacionados (+2,0%) e informação e comunicação (+1,7%). Por outro lado, o setor agropecuário caiu 2,3% no 2º trimestre.
No que se refere à ótica da demanda, tanto o consumo das famílias quanto o consumo do governo avançaram 1,3% na passagem trimestral. A formação bruta de capital fixo, por sua vez, cresceu 2,1% no 2º trimestre de 2024. Por fim, a contribuição externa foi negativa, com crescimento de 1,4% das exportações no trimestre, abaixo do avanço de 7,6% das importações no mesmo período. Todos os dados acima contemplam ajuste sazonal e são detalhados na Tabela 1.
Principais vetores do crescimento no 2º trimestre
O crescimento da economia brasileira entre abril e junho foi influenciado, dentre outros fatores, pela continuidade do forte dinamismo do mercado de trabalho. A taxa de desemprego encerrou junho em 6,9%, patamar historicamente baixo e que corresponde à mesma taxa observada em junho de 2014, período que antecede a recessão econômica brasileira mais recente (Gráfico 1). Este resultado refletiu o expressivo aumento da população ocupada que, ao longo do ano, tem sido puxada sobretudo pela ocupação formal (Gráfico 2). Segundo informações do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), houve a criação de aproximadamente 1,3 milhão de novas vagas de emprego formal no 1º semestre de 2024, acima do número de vagas criadas neste mesmo período do ano passado (1,0 milhão).
Gráficos 1 e 2 – Taxa de Desemprego (%) e Crescimento da População Ocupada (%)
Um dos reflexos desse dinamismo do mercado de trabalho tem sido a elevação dos salários. Segundo dados da PNAD Contínua, o rendimento médio do trabalho cresceu cerca de 5,8% em termos reais em junho de 2024 na comparação com o mesmo período do ano anterior (Gráfico 3). A massa salarial, que corresponde à multiplicação do rendimento médio do trabalho pela população ocupada, avançou 9,2% nesta mesma métrica (Gráfico 4).
Gráficos 3 e 4 – Rendimento Real do Trabalho e Massa Salarial (em R$)
Para além do forte ritmo de crescimento dos rendimentos ligados ao trabalho, a renda das famílias também tem crescido devido às transferências governamentais via benefícios de assistência e previdência social, à elevação real do salário-mínimo e ao pagamento dos precatórios. Cabe destacar que a renda no 2º trimestre também foi potencializada pela antecipação do pagamento do 13º salário para aposentados, pensionistas e beneficiários de auxílios previdenciários do INSS[2].
Neste cenário, estimamos que a massa salarial ampliada tenha crescido cerca de 11,0% em termos reais no 2º trimestre de 2024 na comparação com o mesmo período do ano anterior[3]. Dessa forma, o consumo das famílias foi um dos principais drivers do crescimento da economia brasileira no 2º trimestre, ao estimular o consumo de bens e serviços, mitigando, assim, os efeitos da política monetária ainda contracionista.
Ademais, o 2º trimestre do ano foi marcado pelo desastre climático ocorrido no Rio Grande do Sul em função das fortes chuvas no final de abril e início de maio. Para além do imensurável impacto humano e social do desastre, o período também foi caracterizado pela incerteza elevada quanto aos impactos econômicos do evento para o restante da economia. O estado gaúcho participa com 6,5% do PIB nacional, 12,6% do PIB da agropecuária e 8,3% do PIB da indústria de transformação. Naquele contexto, havíamos alertado, em junho, que o desastre poderia ter impacto negativo de aproximadamente 0,34 p.p. no PIB, algo em torno de R$ 39,4 bilhões.
Contudo, à medida que as pesquisas setoriais foram sendo divulgadas após o desastre, foi possível notar que o evento teve um impacto mais brando que o esperado na atividade econômica. Em junho, a Pesquisa Industrial Mensal (PIM/IBGE) registrou crescimento de 4,1% da indústria geral, resultado influenciado sobretudo pela indústria de transformação, que avançou 4,5% no período[4]. A recuperação do Rio Grande do Sul ficou mais evidente com o crescimento de máquinas e equipamentos (+2,4%), produtos de metal (+1,4%), químicos (+6,5%), móveis (+1,1%) e fumo (+19,8%) em junho, segmentos relevantes na indústria gaúcha.
O Gráfico 5 apresenta a evolução mensal da produção industrial do Rio Grande do Sul. Como é possível observar, o crescimento de 34,9% da produção industrial gaúcha em junho mais do que compensou a queda de 26,3% registrada em maio, o que indica que a volta da produção de várias unidades produtivas afetadas, direta ou indiretamente, pelas fortes chuvas ocorreu de forma mais rápida que o esperado. Este impacto menos forte que o antecipado do desastre climático sobre a atividade foi um dos fatores que contribuiu para o resultado do PIB no 2º trimestre do ano.
Gráficos 5 – Produção Física Industrial do Rio Grande do Sul
Variação % mensal – com ajuste sazonal
Já o setor agropecuário devolveu parte do crescimento observado no 1º trimestre (+11,1%), ao cair 2,3% no 2º trimestre. Cabe pontuar que a safra de grãos é concentrada majoritariamente no começo do ano. No caso da soja, por exemplo, cerca de 60% da colheita é realizada no 1º trimestre do ano.
Indústria de transformação: desempenho positivo no 2º trimestre reforça cenário esperado de recuperação no ano
A indústria de transformação intensificou o processo de retomada observada no 1º trimestre (+0,9%) ao crescer 1,8% no 2° trimestre. Com este desempenho, o segmento registra alta de 1,9% no 1º semestre de 2024 na comparação com o semestre anterior, após aumentar 0,5% no 2º semestre de 2023. Este processo tem sido favorecido pelo bom desempenho da categoria de bens de capital e bens de consumo. A primeira categoria tem sido beneficiada pela expansão do crédito e pela recuperação da confiança dos empresários. No primeiro semestre do ano, o expressivo crescimento da produção de veículos pesados, como ônibus e caminhões, contribuiu para este desempenho[5].
Já a categoria de bens de consumo tem sido impulsionada pelo crescimento da renda e do crédito, no contexto acima analisado, de mercado de trabalho aquecido e crescimento da massa salarial ampliada. A produção de bens de consumo duráveis, mais relacionado ao acesso a crédito, apresenta trajetória de recuperação em 2024, com destaque para o crescimento da produção de máquinas, aparelhos e materiais elétricos da chamada “linha branca”, como máquinas de lavar e fogões, além de móveis, a exemplo de armários e camas.
O setor manufatureiro também tem sido beneficiado pela retomada dos investimentos. A formação bruta de capital fixo cresceu 2,1% no 2º trimestre, mantendo variação positiva registrada desde o 4º trimestre de 2023. Este desempenho dos investimentos também tem sido influenciado pela recuperação de bens de capital[6].
Nesta conjuntura menos restritiva para a indústria, destaca-se o elevado nível de utilização da capacidade instalada (NUCI). De acordo com a Sondagem Industrial realizada pela FGV, o NUCI da indústria de transformação está acima da sua média do histórica, de 79,7%. O indicador atingiu 83,4% em julho, maior nível desde maio de 2011 (83,6%).
Contudo, do ponto de vista estrutural, o setor continua enfrentando desafios. A produção industrial ainda se encontra 14,3% abaixo do nível recorde alcançado em maio de 2011. Assim, apesar do NUCI ter atingido patamar recorde, o indicador está sendo mensurado em um contexto de capacidade instalada deteriorada e reduzida. Nesse cenário, a partir da agregação dos dados após 1996, a Fiesp identificou uma longa estagnação do estoque de capital desde 2015[7]. Esse processo é reflexo, dentre outros fatores, do ambiente econômico adverso, que tem impactado a capacidade de investimento da indústria de transformação.
Cenário Prospectivo
A Fiesp espera uma acomodação da atividade na segunda metade do ano, em função do menor impulso fiscal e da manutenção da política monetária restritiva. Nesse contexto, é esperado um crescimento mais fraco para o PIB brasileiro à frente, com estabilidade no 3º trimestre e redução de 0,3% no 4º trimestre de 2024 (Gráfico 6).
Gráfico 6 – Produto Interno Bruto
Variação % trimestral – com ajuste sazonal
Diante das informações disponíveis até o momento e, sobretudo, devido às surpresas positivas da atividade no 1º semestre, a Fiesp revisou a projeção de crescimento da economia brasileira de 2,2% para 2,7% em 2024. Logo, o ritmo de crescimento observado em 2023 deverá ser mantido. Contudo, cabe destacar que, diferentemente do que foi observado em 2023, espera-se que a composição do PIB seja mais benigna neste ano, com crescimento da indústria e dos investimentos, o que pode sinalizar o aumento da capacidade produtiva, que, por sua vez, pode contribuir para o crescimento brasileiro no médio/longo prazo. Já para o PIB do estado de São Paulo, a projeção é de aumento de 2,4% para 2,5% neste ano.
Para o PIB da indústria de transformação brasileira, a projeção de crescimento passou de 1,5% para 2,5% em 2024. Um dos fatores que justifica esta revisão altista foi a retomada mais rápida que o esperado da atividade industrial gaúcha após o desastre climático ocorrido entre o fim de abril e o início de maio.
Por fim, o cenário atual aponta para uma desaceleração do ritmo de crescimento da economia brasileira em 2025, em função dos juros restritivos e do menor impulso fiscal estimado para os próximos trimestres (Gráfico 7).
Gráfico 7 – Impulso Fiscal
Fonte: elaboração Fiesp a partir de dados do IBGE.
[1] O carregamento estatístico diz respeito à herança estatística de uma série. Isso significa que mesmo que o PIB brasileiro fique estável ao longo dos dois próximos trimestres, ainda deverá crescer 2,5% em 2024.
[2] Estes pagamentos foram realizados em duas parcelas: i) a primeira realizada em abril, que correspondeu a 50% do valor, sem descontos; ii) a segunda realizada entre maio e início de junho, que correspondeu ao restante do valor, com descontos (inclusive Imposto de Renda). Normalmente, o pagamento deste abono é realizado no 2º semestre, em agosto e novembro. De acordo com o INSS, a medida beneficiou mais de 33 milhões de brasileiros, tendo injetado cerca de R$ 67 bilhões na economia, segundo estimativa do governo federal.
[3] Estimativa incorpora à massa salarial ampliada os precatórios pagos pela União no final de 2023 e início de 2024, cerca de R$ 93 bilhões.
[4] A nota completa elaborada pela Fiesp sobre o resultado da produção industrial de junho pode ser acessada aqui: https://www.fiesp.com.br/noticias/com-forte-aumento-em-junho-producao-industrial-fecha-o-2o-trimestre-com-avanco-de-07/
[5] Segundo dados da ANFAVEA, na comparação entre o 1º semestre de 2024 e o mesmo período de 2023, a produção de ônibus cresceu 53,8% e a de caminhões, 36,5%. A produção de caminhões está recuperando os patamares normais após o processo de adaptação tecnológica (Euro 5 para Euro 6) implementado no início de 2023.
[6] Na comparação entre o 1° semestre de 2024 e o mesmo período do ano passado, a categoria de bens de capital avançou 5,0%. Já a importação de bens de capital aumentou 16,5% na mesma métrica.
[7] O estudo completo está disponível em: https://www.fiesp.com.br/file-20231002174745-estoque-de-capitalusoexrefino/