O MERCADO REGULADO DE CARBONO NO BRASIL
EMBAIXADOR JOSÉ CARLOS DA FONSECA JR.
Diretor executivo da IBÁ, com assento no Comitê Diretor doThe Forests Dialogue (TFD), no Advisory Committee on SustainableForest-based Industries (ACSFI), da FAO, e Cofacilitador da CoalizãoBrasil Clima, Florestas e Agricultura.
Os últimos movimentos do Brasil aprofundaram o necessário, e quase atrasado, debate sobre o mercadoregulado nacional de créditos de carbono. Sem medode errar, o País, que tem potencial para liderar estaagenda, já estava ficando para trás nesta corrida em que a vitóriaé a limitação do aumento da temperatura terrestre.Há mais de uma década, o Brasil vem arrastando esta discussão, o que, infelizmente, retardou também qualquer decisão eimplantação de um modelo de precificação regulado.A Política Nacional sobre Mudança do Clima, instituída em2009, já previa em seu texto diretrizes para uma economia debaixo carbono, na qual o mercado regulado se mostrava comouma das saídas. No entanto, o Brasil ficou de fora do PMI, iniciativa do Banco Mundial para implementação do mercado nospaíses interessados. À época, a instituição internacional foi taxativa ao afirmar que “foram selecionados os países que estavammais avançados”. Um choque de realidade.No último mês de maio, contudo, o Governo Brasileiro enfim deu passo concreto rumo a um futuro inescapável. A IBÁestava presente no Jardim Botânico, Rio de Janeiro, quandoo Ministério do Meio Ambiente (MMA) anunciou o Decreto11.075 que, segundo as autoridades, marcou a criação do mercado regulado de créditos de carbono no Brasil.Não se pode ignorar a relevância de iniciativa, uma vezque finalmente poderemos começar a recuperar parte do tempoque fora perdido. Mas é importante analisar com equilíbrio oseixos propostos pelo texto.Diferentemente do modelo mais corrente em outros países eregiões, o sistema apontado como caminho a ser seguido não sebaseia no chamado cap and trade, quando o governo estabeleceuma linha-base de emissões de CO2. Aqui, o MMA espera queos segmentos diversos da economia definam suas propostas demetas setorialmente.Se, por um lado, como afirmam representantes do poder público, isto significa maior abertura ao diálogo ao invés de umaimposição, é importante observar que a iniciativa privada teráo desafio fundamental de cotejar seus próprios interesses comas exigências de efetiva redução da pegada de carbono, em respeito ao clima do planeta e aos anseios dos consumidores. Não se trata só de cifras, mas de mitigar as mudanças climáticas. Aogoverno caberá a tarefa árdua de negociar com cada um dossetores e gerenciar possíveis conflitos entre interesses própriosversus a realidade mais ampla do futuro sustentável.Outra dimensão presente no Decreto que merece atenção éa criação da plataforma para registro de créditos de emissõesde GEE chamada Sistema Nacional de Emissão de Gases deEfeito Estufa (Sinare). Fundamental ter olhar crítico e atento aeste ponto, eis que transparência e integridade são elementoscentrais para que um projeto desta magnitude avance de fato.Para além dessas discussões e debates, persiste a necessidadede que uma legislação sobre o tema defina regras e regulamenteo mercado de créditos de carbono. Isto é imprescindível paradar segurança jurídica e para que tal engrenagem funcione.Nessa matéria, a verdade é que o País precisa ficar mais contemporâneo das melhores práticas. A União Europeia, paísescomo a Colômbia, Estados sub-regionais, como a Califórnia,são alguns dos exemplos de mercados de carbono já em plenofuncionamento.Passamos da hora, mas ainda não perdemos a oportunidade. É fundamental termos agilidade para que a precificação decarbono não fique, mais uma vez, no plano das boas intenções.O setor de árvores cultivadas, por meio da IBÁ e de suas associadas, está pronto para ser cooperativo. Felizmente o modusoperandi das companhias em nosso setor há anos já posicionaesta agroindústria como aliada das melhores práticas sustentáveis. O diálogo, que sempre pautou nossas ações, segue abertopara trabalhar em prol do setor e do País. Fato é que não há descarbonização possível sem o Brasil.E para haver um país colaborativo na questão climática temosuma rota bastante clara a ser percorrida: combater com energiaas criminalidades ambientais e ir além do comando e controle,valorizando toda a dimensão socioambiental. Mercado reguladode carbono é um dos caminhos, do mesmo modo que pagamento por serviços ambientais como água, solo e biodiversidade.Está nas mãos desta nação com ricos ativos ambientais a escolhaentre ser o País do desenvolvimento verde ou se vamos continuarostentando o título de “País do futuro”, sem fazer com que o potencial vire oportunidade para o Brasil e para os brasileiros.