A biomassa e seus resíduos representam uma matéria-prima abundante e sustentável, rica em carbono, que pode ser empregada para produzir, por exemplo, bioquímicos, biocombustíveis, fibras e nutrientes. À medida que a urgência em utilizar métodos de processamento e matérias-primas sustentáveis se torna cada vez maior em relação às mudanças climáticas, o interesse em como processar de forma otimizada essa matéria-prima tem aumentado no planeta.
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Para obter produtos valiosos e úteis, a densa estrutura cristalina dessa matéria-prima requer um pré-processamento. Os seus três principais blocos construtivos são:
(i) lignina,
(ii) celulose e
(iii) hemicelulose.
Enquanto a celulose é uma estrutura extremamente densa, consistindo principalmente de unidades de β(1→4)-D-Glicose, estruturadas em uma fita helicoidal, a hemicelulose e a lignina são mais diversas, contendo uma infinidade de diferentes compostos, os mais importantes dos quais são representados na Figura 1.
Entretanto, a biomassa e seus resíduos são um recurso subexplorado que pode gerar produtos valiosos em uma economia circular. Disponível localmente, tais resíduos podem ser processados, obtendo-se produtos de alto valor agregado por meio de uma biorrefinaria de pequeno porte e flexível.
A flexibilidade no tipo de matéria-prima e o uso de biomassa local garantem a disponibilidade contínua da matéria-prima a baixos custos logísticos. No entanto, a viabilidade e a sustentabilidade da biorrefinaria devem ser garantidas pelo projeto e pela operação ótima dos processamentos utilizados.
Embora o projeto dependa da matéria-prima disponível e dos produtos desejados, a otimização requer o uso de simulação e otimização matemática da biorrefinaria (Sbarciog, M. et al., 2022).
Embora biorrefinarias centralizadas e em larga escala já estejam implementadas em nível industrial, sua natureza de alto investimento e requisitos rigorosos de matéria-prima as tornam, muitas vezes, inadequadas para áreas com uso diversificado da terra ou produção agrícola.
Biorrefinarias de pequeno porte, por outro lado, exigem investimentos menores e podem ser adaptadas à área específica em que serão empregadas. Se adequadamente projetadas e operadas, essas instalações podem converter a biomassa e seus resíduos em produtos de alto valor, resultando em benefícios ambientais e ganhos econômicos locais.
No entanto, as biorrefinarias de pequena escala ainda não são devidamente utilizadas, muitas vezes devido à conscientização limitada sobre essas soluções de processamento da biomassa e seus resíduos por parte dos stakeholders ou à falta de confiança em sua sustentabilidade econômica, criando um ciclo vicioso de desconfiança e implementação limitada.
Sbarciog, M. et al. (2022) buscou em suas pesquisas quebrar esse ciclo, propondo uma metodologia holística de design e otimização para biorrefinarias de pequeno porte na Europa Ocidental, da qual faço alguns comentários a seguir.

A metodologia foca nos três principais aspectos de qualquer processo do biorefino da biomassa e seus resíduos:
• Cadeia de suprimentos: para modelar a cadeia de suprimentos da biorrefinaria de pequeno porte, métodos de georreferenciamento (GIS) são utilizados para avaliar a disponibilidade da matéria-prima e volumes, utilizando apenas bancos de dados disponíveis gratuitamente.
• Simulação: a partir de um desenho de processo, realiza-se a simulação de modelos de processo cinéticos adaptados da literatura — por exemplo, com o software SuperPro — bem como das fontes de energia para contabilizar o consumo de energia.
• Otimização: por meio de algoritmos de programação multiobjetivo são utilizados visando à maximização do lucro e minimização do consumo energético da planta de pequeno porte.
Esses três aspectos de projeto e otimização são combinados em uma metodologia holística, tornando-se, dessa forma, uma ferramenta de apoio à decisão “virtual” da prova de conceito. Com isso, tem-se um guia para usuários não especialistas em projeto e otimização de biorrefinarias de pequeno porte.
Embora inicialmente calibrada para a Europa Ocidental, a metodologia holística proposta por Sbarciog, M. et al. (2022) pode ser facilmente adaptada a diversos contextos geográficos no Sul Global e para diferentes cenários de tipo e volumes de matéria-prima.
A Figura 2 ilustra um esquema simplificado de uma biorrefinaria com suas três partes: matéria-prima, processo e produto, e suas respectivas principais decisões estratégicas. ■
Referência:
Sbarciog, M. et al. Design, Implementation and Simulation of a Small-Scale Biorefinery Model. Processes, 2022, 10, 829. Disponível em: https://doi.org/10.3390/pr10050829