O setor de celulose e papel enfrenta um cenário de transformações profundas e desafios urgentes em 2025, tanto na esfera global como brasileira. A agenda das empresas do setor está diretamente ligada à capacidade de introduzir no seu modelo de gestão, práticas e valores que permitam sua vantagem competitiva no curto e no longo prazo.
À medida que o Brasil mantém sua posição de destaque na produção global, as empresas devem alinhar suas estratégias com as necessidades da sociedade e as exigências do mercado. Neste sentido, preparei uma sequência de dois artigos que abordam questões significativas sobre o tema. Na coluna Estratégia e Gestão deste mês (Fevereiro/2025), apresento-vos a 1.ª parte do assunto. A sequência poderá ser lida na edição do mês de Março.
LEIA AQUI O DOCUMENTO ORIGINAL PUBLICADO NA REVISTA O PAPEL – EDIÇÃO DE FEVEREIRO 2025
1. Sustentabilidade e Práticas Ambientais
O setor de celulose e papel continua sob crescente pressão global para adotar práticas ambientalmente responsáveis. No Brasil, empresas líderes implementaram iniciativas de manejo florestal sustentável, com certificações reconhecidas internacionalmente, como FSC (Forest Stewardship Council) e PEFC (Programme for the Endorsement of Forest Certification).
Além disso, as florestas plantadas no Brasil, em sua grande maioria compostas por Eucalipto e Pinus, destacam-se pela produtividade e captura de carbono, representando uma vantagem competitiva significativa.
O Brasil, com cerca de 10 milhões de hectares de florestas plantadas, possui uma base florestal renovável que abastece múltiplas indústrias no país. Além disso, a prática de cultivar recursos renováveis, sem recorrer ao corte de florestas nativas, coloca o Brasil em um patamar de excelência em termos de sustentabilidade. Aproximadamente 37% dessas florestas são dedicadas ao setor de celulose e papel, e o compromisso com a biodiversidade é evidenciado pela preservação de cerca de 6 milhões de hectares de florestas naturais, correspondentes às áreas de preservação permanente e reservas legais.
Porém, o crescente interesse por práticas ESG (Environmental, Social and Governance) e as novas exigências regulatórias ambientais podem impactar a competitividade do setor, principalmente entre empresas de menor porte. Não é fácil nem barato seguir a complexidade das múltiplas normas e leis.
Além disso, a legislação ambiental brasileira, com a sobreposição de regras em níveis municipal, estadual e federal, gera insegurança jurídica e custos operacionais e administrativos adicionais. A pressão externa por conformidade com normas rigorosas, como o Regulamento de Desmatamento da União Europeia (EUDR), também representa um desafio para o Brasil, embora a recente prorrogação de sua implementação ofereça um alívio temporário.
2. Economia Circular
A economia circular tem ganhado força no setor de celulose e papel como uma maneira de maximizar o aproveitamento de resíduos e reduzir desperdícios. O reaproveitamento de aparas, especialmente no segmento de embalagens de papelão, movimenta volumes significativos no mercado brasileiro.
Com a crescente demanda por insumos reciclados, o Brasil também importa grandes quantidades de aparas anualmente para suprir essa necessidade, conectando-se a um mercado global de economia circular.
O uso do lodo de celulose como fertilizante agrícola é outro exemplo de como a indústria tem transformado passivos ambientais em fontes de receita adicional.
Além disso, o licor negro, um subproduto do processo de produção de celulose, há décadas vem sendo utilizado para gerar energia elétrica por meio de caldeiras de recuperação. Essa abordagem não só fortalece a eficiência do setor como também contribui para a transição energética global, permitindo que as empresas vendam o excedente Excedente de energia para o Sistema Interligado Nacional ou para consumidores privados no mercado livre de energia. Apesar das vantagens econômicas e ambientais dessa abordagem, as barreiras técnicas em tecnologias de reciclagem, especialmente para tipos específicos de papéis e embalagens, ainda precisam ser superadas.
3. Inovação tecnológica
A inovação tecnológica continua a ser um dos principais motores para a competitividade no setor de celulose e papel. A automação, o uso de inteligência artificial (IA) e a produção de bioprodutos têm ampliado o alcance da indústria além do papel e celulose tradicionais. A implementação de IA, por exemplo, tem se mostrado uma solução eficaz para otimizar parâmetros de manutenção preventiva, antecipando falhas e melhorando a produtividade das operações. Em paralelo, a gestão de frota para o abastecimento de madeira e as operações de colheita florestal também se beneficiam de tecnologias de monitoramento em tempo real, que permitem um planejamento mais eficiente e redução de custos.
Na colheita, especificamente, a IA pode contribuir enormemente nas análises de produtividade e custos em estudos de tempo e movimento… mas me pergunto por que ainda não temos resultados práticos sobre o tema???
Entretanto, a adoção dessas soluções enfrenta desafios consideráveis. O alto custo inicial de implementação, a falta de conhecimento técnico em algumas áreas e o tempo necessário para adaptar as operações às novas tecnologias são limitantes frequentemente reportados pelas empresas. A resistência à mudança também é uma barreira cultural presente, principalmente em setores mais tradicionais da indústria, liderados muitas vezes por gestores com visão “mais cartesiana” de negócios.
Ainda assim, exemplos de empresas que investem em biocompósitos para substituir plásticos e desenvolvem bioplásticos a partir de fibras celulósicas indicam que o setor está se adaptando para atender às exigências do mercado global por soluções mais sustentáveis.
4. Capacitação e retenção de talentos
A modernização tecnológica e as novas exigências ambientais trazem consigo a necessidade urgente de profissionais qualificados, tanto nas fazendas quanto nas operações industriais. A dificuldade de contratação está mais concentrada na mão de obra, principalmente para o campo, especialmente em tarefas que envolvem jornadas extenuantes e braçais.
Há décadas tivemos uma migração da população rural para as cidades, no intuito de melhoria do padrão de vida e das amenidades do núcleo urbano. O jovem trabalhador tem demonstrado resistência em se engajar em atividades em fazendas, o que reflete uma mudança nas preferências profissionais tradicionais.
Para reduzir a dependência do trabalho humano nessas tarefas da zona rural, a automação de atividades operacionais tem se mostrado essencial. O uso de máquinas florestais automatizadas, como plantadeiras e máquinas de colheita, reduz a necessidade de intervenção humana, mas aumenta a demanda por profissionais especializados para operar esses equipamentos.
Além disso, tecnologias como drones e sistemas de geoprocessamento, que são cada vez mais utilizados para monitoramento de florestas, planejamento de colheitas e gestão de áreas, também exigem profissionais qualificados para operar e analisar dados. A falta de mão de obra capacitada para esses papéis, como operadores de drones e especialistas em geotecnologia, tem sido um desafio crescente.
Por outro lado, nas operações industriais, embora a escassez de mão de obra qualificada também seja uma preocupação, a necessidade se concentra em funções de alta especialização. As indústrias demandam profissionais para operar tecnologias de ponta, como sistemas automatizados de controle de processos e equipamentos de última geração.
Há uma escassez especialmente de operadores de máquinas sofisticadas, especialistas em coleta e análise de dados e profissionais qualificados para gerenciar processos automatizados. Até mesmo em manutenção tem-se limitação de profissionais, uma vez que se tem cada vez mais tecnologia embarcada em máquinas e equipamentos.
A falta desses profissionais especializados tem se tornado um obstáculo para a implementação plena de novas tecnologias e para a manutenção da competitividade no setor.
Conclusão
Em 2025, a agenda das empresas do setor de celulose e papel estará cada vez mais centrada na busca por ações que as mantenham competitivas. O Brasil, como um dos maiores produtores mundiais, possui uma oportunidade única de liderar essa transformação.
Contudo, avaliando o cronograma atual de crescimento do setor, entendo que o desafio será crescente para as empresas, dentro dos aspectos aqui citados.